A Arte Culinária de Julia Child
A primeira vez que ouvi o nome Julia Child foi assistindo à terceira temporada do MasterChef Amadores, exibida em 2016 pela TV Band, quando o participante Fernando Cavinato mencionou sua técnica para fazer um ovo poché impecável. Curiosa, fui pesquisar sobre essa figura que, para muitos, revolucionou a maneira como os americanos — e depois, o mundo — viam a cozinha francesa. Foi então que me deparei com A Arte Culinária de Julia Child, publicado no Brasil em maio de 2013 pela Editora Pensamento. Um livro com 240 páginas, recheado de dicas, truques e receitas que, mais do que ensinar a cozinhar, nos ensina a respeitar o ato de preparar alimentos com dedicação e prazer.
História e Legado
Julia Child nasceu em 1912 e, surpreendentemente, só começou a cozinhar aos 32 anos. Até então, como ela mesma dizia com humor, “só comia”. Mudou-se para a França acompanhando o marido diplomata e, para combater o tédio, decidiu se matricular nas aulas da renomada escola de culinária Le Cordon Bleu. Dessa escolha nasceu não apenas uma chef, mas um ícone cultural. Com carisma, bom humor e um jeito desengonçado que cativava o público, Julia não só tornou a culinária francesa acessível aos americanos como também inspirou gerações. Sua estreia na televisão, com o programa The French Chef, foi um divisor de águas para a gastronomia nos Estados Unidos. Mas foi com seu livro Mastering the Art of French Cooking — aclamado como uma “bíblia” culinária — que ela eternizou sua marca.
A Arte Culinária de Julia Child é uma versão condensada dessa obra monumental. Voltado para quem já tem certa familiaridade com a linguagem e os utensílios de cozinha, o livro não é exatamente um manual para iniciantes, mas sim um guia prático e inspirador para quem deseja se aprimorar. Ele é organizado de forma funcional em oito partes: “Sopas e molhos básicos”, “Saladas e seus molhos”, “Legumes”, “Carnes, aves e peixes”, “Ovos”, “Pães, crepes e tortas”, “Bolos e biscoitos” e “Equipamentos de cozinha e glossário”.
Entre os destaques do livro, estão receitas que prometem — e cumprem — transformar uma refeição comum em uma experiência sensorial. Recomendo especialmente o ossobuco com caldo de frango cozido lentamente, uma receita que, só de ler, faz com que o aroma invada a sua cozinha. A quiche lorraine, com seu bacon frito e massa amanteigada, é outra estrela; e, claro, há o lendário boeuf bourguignon, prato símbolo de Julia, cuja execução requer paciência, mas o resultado é absolutamente recompensador.
Para encarar qualquer desafio culinário
Embora seja uma edição relativamente simples, sem muitas fotos ou ilustrações (há apenas algumas imagens da autora em seus programas de TV), o conteúdo é robusto. Julia oferece, ao longo das páginas, sugestões de substituições, correções para receitas desandadas e conselhos práticos que só uma cozinheira experiente saberia dar. Como ela mesma diz: para virar uma panqueca — ou encarar qualquer desafio culinário — é preciso ter coragem.
O livro transmite exatamente isso: coragem e prazer na cozinha. E mesmo leitores com pouca prática, como eu, conseguem sentir-se encorajados a experimentar. Fiz a vichyssoise por influência da Julia Child, e a sensação de servir um prato clássico, bem executado e saboroso é indescritível. E ainda estou criando coragem para tentar o pain de Gênes, um bolo de amêndoas que já me fisgou pela descrição.
Influência na gastronomia mundial
A influência de Julia Child vai além das receitas. Ela mudou a forma como encaramos o ato de cozinhar — não como uma tarefa obrigatória, mas como um ato de amor, cultura e prazer. Como bem disse Anthony Bourdain: “Ela será lembrada pelo que ela fez nessa terra, que era inspirar milhares de pessoas a cozinhar — e comer — melhor.”
Em tempos em que a gastronomia virou espetáculo, A Arte Culinária de Julia Child nos leva de volta à essência da cozinha: paciência, técnica e alegria. Um livro indispensável para quem ama cozinhar — e comer — com alma.