Alice no País das Ideias: uma jornada filosófica sobre como viver

Será que existe mesmo uma resposta para “como viver” ou vivemos justamente para continuar perguntando?
Este livro tem tudo para se tornar um clássico da ficção francesa, no qual literatura e filosofia se entrelaçam de forma singular. De um lado, uma viagem ao país das ideias; de outro, uma descoberta ímpar, só possível pelo conhecimento e pelo tempo.
Alice, menina dos tempos atuais, busca responder à pergunta essencial: ‘como viver?’. Uma questão simples na forma, mas profunda na vivência. Uma das maneiras de penetrar essas camadas é por meio de nossa própria história, cujos conceitos foram moldados, transformados e intensamente debatidos ao longo do tempo.
O País das Ideias: um Lugar Onde o Pensar é Viver
A viagem ao País das Ideias nos conduz para além da mera formulação de perguntas, como, por exemplo, “como viver?”. Ela nos revela as inúmeras camadas do iceberg chamado filosofia, em que a dualidade não é obstáculo, mas condição para que o debate se mantenha fecundo, vasto o suficiente para nos levar a pensar não apenas sobre a realidade, mas também sobre o modo como a percebemos e o que escolhemos fazer com ela.
Ao final de cada capítulo, Alice registra em seu diário e também reflete sobre a pergunta-chave: ‘qual é a frase para viver?’. Em uma das partes do diário, vemos como Alice mergulha no mundo e, ao mesmo tempo, ainda aprende a caminhar por ele:
“A impressão que dá é que a minha cabeça está com cãibra. Examinar ideias, procurar suas origens, questionar como viver… Nunca me fiz tantas perguntas.
Como me expressar? Não sei realmente em que ponto estou. Tudo está em xeque. (…) Assim que compreendo algo, um recém-chegado me mostra que as ideias que começo a adotar não se sustentam.” (p. 98)
O Conselho da Rainha Branca
Diante da constante tensão entre ideias, percebemos que o xeque está sempre sendo lançado. O entendimento da filosofia, portanto, vai além da abstração conceitual: percorre toda a estrutura de pensamento de cada autor. Alice fica brava, não quer mais passear no país das ideias, porque sua ideia ainda não foi respondida.
Na passagem a seguir, vemos uma conversa da Alice com a Rainha Branca, chefe do país, que orienta os visitantes e supervisiona essas viagens. E esse diálogo nos mostra o poder das ideias:
“Há mil coisas que pensa de modo diferente, mas continua sendo Alice! Portanto, examinando suas ideias, você poderia crescer… sem se perder!
— Sim, é uma possibilidade. Mas há ideias demais! No fim, isso acaba amedrontando.
— Compreendo que seja desconcertante, mas você tem a sensação de que essas descobertas fecham seus horizontes ou lhe abrem novas possibilidades?
— Abrem… Terrivelmente!”
Quando a Indiferença se Torna Moda
Enquanto Alice se perde e se reencontra nas ideias, lá fora o mundo parece ignorá-las, um reflexo da indiferença que hoje se espalha nas redes e nos debates rápidos, como mostra o podcast mirim.
Isso porque, recentemente, viralizou no YouTube um vídeo em que um adolescente de cerca de 12 anos, em um podcast mirim, finge uma astúcia precoce e declara: “Para que ler Aristóteles? Não serve para nada.” (Confesso, caros leitores, que nem sabia que esse tipo de podcast existia.) Diante dessa cena, teria a ruptura do país das ideias:
“Talvez o País das Ideias também esteja ameaçado por uma catástrofe muito pior: a indiferença. O desinteresse por tudo, a convicção de que as ideias não passam de vento, que todas valem o mesmo e não valem nada, um tempo em que se renunciariam a refletir e a lutar, em que já não se acreditaria em nada, em que não se esperaria mais nada.” (p.315)
Filosofia Como Ato de Resistência
Esse episódio ilustra o espírito utilitarista que permeia os tempos atuais e nos leva a um ponto de inflexão: a redescoberta da importância do “inútil”.
Paradoxalmente, é apenas quando algo se apresenta como inútil que pode revelar sua utilidade mais profunda. Estudar filosofia é, nesse sentido, um ato de resistência, que se sustenta por pelo menos três razões:
- O progresso só nasce das perguntas e do conhecimento que delas decorre.
- É preciso quebrar concepções que antes considerávamos absolutas.
- A reflexão é tão vital quanto o ato de se alimentar.
A Rainha Branca explica a Alice que a filosofia é essencial não apenas para compreender a vida, mas porque é a partir da vida das ideias que existe avanço. O País das Ideiassó existe porque o desacordo é necessário.
Uma Viagem que Transforma
A viagem é longa e cheia de nuances, e Alice vai se transformando à medida que caminha. A jornada começa com Sócrates e passa por Platão, Epicuro, os hebreus, Confúcio, Hipácia, Avicena, Montaigne, Freud, Nietzsche e tantos outros.
No fim da viagem, Alice recebe outras surpresas, talvez as mais belas do livro, quando o diário do autor apresenta cinco regras que Alice deve viver para compreender “como viver”, retomando todo o percurso ao país das ideias:
“Porque viver é algo que se inventa o tempo todo, que se reinventa sem parar, assume formas diferentes, percorre caminhos novos. As receitas nunca serão as mesmas, a depender das épocas, dos temperamentos, das idades, dos ambientes.
Uma única coisa importa, a atitude. Não os detalhes, mas a maneira de abordar tudo. Descobrir como viver é, antes de mais nada, encontrar a atitude.” (p.363)
Em uma das entrevistas, Roger-Pol Droit explica a sua motivação para escrever esse romance filosófico deliciosamente encantador:
“Na realidade, meu objetivo principal não é expor doutrinas, mas fazê-las viver de dentro para fora, compartilhando as experiências intelectuais e afetivas que forjam a reflexão. A história da filosofia não tem interesse por si mesma: deve servir para iluminar o nosso presente, orientar nossas decisões para o futuro, preservando sempre a liberdade de cada um.”
Com uma linguagem ímpar, a leitura fluida torna-se uma verdadeira jornada. Somos todos um pouco Alice: convidados a mudar, refletir, agir e, principalmente, a tentar encontrar o nosso próprio progresso.
E você? Está disposto a atravessar o País das Ideias, questionar o que pensa saber e descobrir qual seria a sua própria ‘frase para viver’ ou seguirá se contentando com respostas prontas?
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